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Senhora, Senhoras, Senhorinhas.

Nos dias 6/11 e 20/11 de 2019, estive na biblioteca Cristina Poeta, compondo o quadro de apresentações que iriam ocorrer pelo Xll Festival de Teatro de Fortaleza. Quando lá cheguei, a produção me esperava. Não entenderam muito bem qual era minha ação Performática. Me perguntaram: "então, onde vai ser o palco, onde vai ficar a plateia?". Expliquei que não trabalho sob esses moldes, que palco e plateia, para mim, devem ser a mesma coisa. Eles continuaram sem entender. Então eu expliquei que a ação ocorria de modo espontâneo; colocava meus banquinhos em algum local, me sentava num deles; pegava meu tripé com uma placa/chamada posicionada próximo aos bancos e aguardava as pessoas virem até mim, guiadas pela curiosidade de entender o que era aquilo. Notei uma postura meio cética da produção quanto ao funcionamento da ação. Eles devem ter pensando: "esse garoto só pode estar louco". Gosto dessa sensação que a Performance Art causa nas pessoas que estão acostumadas com estéticas e organizações de espetáculos tradicionais. A sensação em si já faz parte do processo performático: causar o estranhamento. Com a performance pronta, fiquei aguardando as pessoas. É interessante que as vezes passo 30, 40 minutos sem ninguém vir participar. Algumas pessoas passam curiosas, ficam olhando de longe, alguns delas na vontade de vir participar. A proposta era: "conversar sobre sentimentos", e todos nos sabemos que é muito bom falar sobre isso. Passado o tempo, sentou a primeira pessoa. Uma senhora. Não lembro a idade. Ela me olhava séria, mas aos poucos, no decorrer da ação, seu semblante foi ficando cada vez mais doce e sereno. Passamos por várias histórias, desde sua infância até o casamento no qual ficou junta do marido por 45 anos. Longos anos difíceis. Conversei com várias outras senhoras e notei que ali, naquele espaço, já havia um público muito grande da terceira idade. Todas as historias se pareciam com a primeira; se casaram muito novas e descobrirem um inferno na terra com o casamento: marido agressivo, geralmente alcoólatra, mais de uma situação de risco de morte, etc. Outra coincidência: todos os maridos estavam mortos e isso representava uma libertação.Muitas disseram que só agora, depois da morte de seus companheiros é que estavam se (re)descobrindo e se abrindo para novas possibilidades e experimentações. As conversas passavam por nostalgias da infância, desejos da adolescência (proibidos pois eram casadas), dor e sofrimento provindos do casamento, mas no final, liberdade e emancipação com o falecimento dos homens. Eu estava simplesmente apaixonado por aquelas senhorinhas que, apesar de todo o sofrimento que viveram, ainda esbanjavam muita vontade de viver e se reinventar. No decorrer da ação, a produção, antes cética, foi observando o campo afetivo que a performance conseguia alcançar. Se rederam. Quando vinham falar comigo, suas posturas e até tonalidade de voz haviam se alterado. Agora, davam crédito para a ação. Muitas outras pessoas começaram a aparecer, dessa vez, eram convidadas pela produção. Sentar e sentir: MicroUniverso de afetos, não tem em seu programa, a atitude de convites. Como havia dito, ela funciona na espontaneidade, na livre escolha das pessoas. Porém, como a performance está aberta para possibilidades, pra mim, essa é uma das essências dessa linguagem hibrida, deixei que os anúncios fossem feitos. No final da ação, mais uma vez, sai carregado de histórias e aprendizados. Eu falo, ouço, e, percebo que sempre após cada ação, algo novo dentro de mim nasce. Termino a ação sentido coisas, me sentido afetado. Nada permanece o mesmo. Fico muito feliz de ter sido contemplado neste Edital. Essa experiencia se moa a outras e estou sempre aguardando por novas.

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